Freira Assisense tem 108 anos e está sempre em atividade: "Eu não sou velha!"
Quando era criança, em São Francisco de Assis (a 400km de Porto Alegre), Inah se aproveitava da fama de frágil para viver a infância como uma menina arteira e voluntariosa. As peraltices, no entanto, podiam ser desculpadas porque ela ouvia com frequência que sua vida não seria longa.
— Eu nasci muito pequenininha. Diziam para o meu pai "cuidado com essa criança, ela não vai chegar aos sete anos" — lembra.
Só que Inah Canabarro Lucas não apenas contrariou as previsões feitas a partir de seu porte franzino, como superou a longevidade que ela mesmo esperava: no último dia 27, completou 108 anos. Depois da aposentadoria, há 20 anos a religiosa deixou Santana do Livramento (a 500km da Capital) e vive no pensionato das Irmãs Teresianas, na Capital.
A filha do meio entre sete irmãos — depois, ganhou mais cinco de criação — Inah lembra em detalhes a vida da família que residia numa fazenda. A casa cheia, como era do gosto do pai João Antônio Lucas, as brincadeiras, as churrascadas, e os costumes:
— Depois da janta, lembro do meu pai na cabeceira da mesa, com os 12 filhos em volta e minha mãe (Mariana Canabarro Lucas), e aquela era a hora de conversarmos. Eu era pequena, estava no colo da mãe e falavam sobre o colégio onde os filhos estudariam, um colégio de freiras. Lembro de ter perguntado o que eram freiram e minha mãe disse que eram mulheres que vivem rezando. E eu disse que queria ser freira e acho que os anjos disseram amém — conta Inah.
Aos 19 anos, Inah entrou para a Companhia de Santa Teresa de Jesus, em Santana do Livramento. Boa parte da vida, dedicou-se ao magistério em cidades gaúchas e também no Rio de Janeiro. Era bastante enérgica em sala de aula.
— Eu dizia: "na aula sou professora, mas no recreio sou uma criança como vocês" — relata a religiosa, que é trineta do general David Canabarro (uma das lideranças da Revolução Farroupilha).
Boa de papo, irmã Inah não escapa da clássica pergunta sobre o segredo para se ter uma vida longa. Mas demonstrando conservar a presença de espírito da infância, desconversa:
Boa de papo, irmã Inah não escapa da clássica pergunta sobre o segredo para se ter uma vida longa. Mas demonstrando conservar a presença de espírito da infância, desconversa:
— Eu não sou velha! E se é um segredo, eu não posso contar! — diverte-se.
Quem observa a expressão leve e o sorriso constante, além dos cabelos pintados, não acredita que já se passou quase uma década do centenário.
— Eu levo tudo na esportiva, que é melhor. Nada me incomoda. Se algo me contraria, para que eu vou guardar? Para fazer mal para o fígado? Eu não! E o cabelo eu não pinto por vaidade, mas para colaborar com as empresas produtoras de tinta — dispara.
Já que o segredo da longevidade não foi revelado, a reportagem buscou pistas do estilo de vida da religiosa.
Já que o segredo da longevidade não foi revelado, a reportagem buscou pistas do estilo de vida da religiosa.
— Como de tudo, menos banana! Gosto de churrasco, de carne gorda. De manhã, tomo um café na minha canequinha do Inter (é colorada, acompanha o desempenho do Internacional nos campeonatos, figurinha conhecida da diretoria do clube) e três bolachas salgadas. Agora me deram uma maçã para comer também. E inventaram que eu tenho que merendar, mas isso tira a vontade de comer no almoço — observa.
E quando sobra uma linguicinha do jantar, irmã Inah guarda para saborear no café da manhã. A animação dela é grande também ao falar sobre o apreço por costelinhas de porco, leitão assado...
Em atividade sempre
Em atividade sempre
Outra característica dos dias da religiosa é manter-se sempre em atividade. Ela conhece vários países e acredita que o dinheiro mais bem empregado é o destinado a viagens.
— Nunca estou sem fazer nada. Quem fica sem fazer nada começa a pensar coisas ruins. Jogo paciência, ou faço palavras-cruzadas, pinto, leio, desenho — conta a idosa que também acompanha o noticiário e tem seus momentos de oração durante o dia.
Foi depois de uma queda no pátio, recentemente, que ela passou a usar um andador — seu "carro", como ela chama o acessório — para garantir o equilíbrio e a autonomia nos deslocamentos. Até o ano passado, costumava sair sozinha. Nas viagens de táxi, não perdia a oportunidade de bater papo com os motoristas.
— Aconteceu tudo isso (referindo-se à queda que a deixou desacordada por alguns instantes) e nada de morrer — disse aos risos.
Por fim, a lição: a felicidade prolonga a vida.
— Sou feliz por ser consagrada, sempre me senti realizada.
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